quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Amor de pessoas

Hoje vim o caminho todo para o trabalho atrás dum carro todo podre, branco, a deitar fumo pelo tubo de escape, daqueles que dão saltos a cada metro, e que quando travam dançam para a frente e para trás, como que ao ritmo dum kizomba que só eles ouvem. O carro saltava tanto e deitava tanto fumo que até vinha com medo que, a dado momento, colapsasse, e se desintegrasse, saltando peças e pessoas por toda a estrada. Liguei o pisca para ultrapassar, ansiosa por sair daquele lento compasso, comecei a espreitar a outra faixa, até que reparo em algo: o carro tinha uns dizeres colados, na parte de trás. Uma autêntica mensagem de paz e amor, um "faz aos outros aquilo que gostas que façam a ti", uma espécie de "dá a outra face e sorri". O que dizia?...

... "Do me a favour.... DIE."

Assim, a seco. Sem introduções, sem explicações, sem contextos. Um desejo negro espelhado num carro da cor da paz, branco imaculado. Um desejo puro de morte, num carro que parecia dançar alegremente os ritmos latinos. Ok, podia ter desconfiado que aquele fumo todo era obra demoníaca, mas nem pensei. "Faz-me um favor e morre", pedia-me ele, a mim e a qualquer pessoa que ousasse segui-lo na estrada, de forma macabra. A força para sair dali aumentou. Volto a olhar para a outra faixa, que finalmente estava desimpedida. Começo a ultrapassar. Vem uma mota a toda a velocidade, quase contra mim. Desisto de ultrapassar. Volto para a minha faixa, para o compasso da morte, evitando assim o choque frontal com a mota. Não lhe fiz o favor e mantive-me viva. Alguém que o faça por mim, ok? Hoje não estava mesmo para aí virada. Até porque não podemos fazer tudo o que nos pedem, pois não? De qualquer maneira - uffff - nunca me soube tão bem chegar sã e salva ao trabalho. Até vou trabalhar com outro entusiasmo, hoje. Um amor de pessoas, aquelas que viajavam naquele carro. Um amor.

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